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sábado, 30 de julho de 2011

A fórmula do socialismo

Por Caetano Araujo

Socialismo é igual a sovietes mais eletrificação rural. Essa definição veio a ser uma das frases mais citadas de Lênin. Como toda fórmula, é reducionista e diz tanto na sua afirmação quanto nas suas omissões. Sua estrutura, socialismo como soma e combinação de um elemento político, de democracia participativa, com um elemento tecnológico, mantém seu potencial de provocação até os dias de hoje. Mas a fórmula inclui também premissas implícitas, cujo desdobramento é fundamental para sua avaliação crítica.


Primeiro, a fórmula supõe a revolução, tal como pensada na época. Ou seja, uma situação em que a propriedade privada foi substituída pela propriedade estatal dos meios de produção. Há um argumento implícito aí: os homens têm potencial para construir relações de novo tipo entre si e a propriedade privada é o obstáculo a esse processo. Remova-se a propriedade e primeiro as classes depois o Estado irão definhar até desaparecer. É preciso apenas manter a ausência de propriedade pela coerção, contra o inimigo interno e externo. Esse socialismo prescinde da política, embora não da repressão.

Pois bem, toda a experiência do século XX detonou esse pressuposto. A abolição da propriedade privada não levou em lugar algum ao surgimento espontâneo de novas relações entre os homens. Sempre acompanhada de regimes de partido único, produziu uma equalização temporária das condições de vida, que não se revelou minimamente sustentável. Acabada a coerção, a equidade regrediu e a implantação da democracia encontra enormes dificuldades nesses países. Ficou claro que novas relações entre os homens, que incorporem de forma sustentável avanços em termos de equidade e inclusão social, só são possíveis sob condições democráticas.

Há uma segunda premissa não declarada, também desmentida pela experiência recente: a superioridade da democracia de conselhos, os sovietes, sobre a democracia representativa tradicional, e a possibilidade de substituir uma pela outra. Os bolcheviques fecharam o legislativo, no meio do processo de produção de uma constituição, e criaram uma república soviética. As décadas seguintes mostraram que, sem representação, sem institucionalidade democrática, a participação acaba. Para participar, o cidadão precisa de garantia de direitos e essa garantia não cai do céu. Os sovietes tornaram-se uma casca vazia e o poder migrou para a direção do partido único. Nesse sentido, vale a constatação de muitos analistas: a revolução bolchevique fechou as portas à mudança, cometeu suicídio, em outras palavras, quando o parlamento russo foi fechado.

Nessa linha de raciocínio, o conceito de socialismo que prevaleceu na era comunista está superado. O fim do mercado e da política revelou-se um beco sem saída. O problema da esquerda hoje não é extinguir, mas regular o mercado e democratizá-lo. Não é pôr fim à representação, mas mudar a sua qualidade e articular essa representação com formas cada vez mais exigentes de participação.

Propomos uma atualização da fórmula de Lenin, uma redefinição de socialismo à luz da experiência do século XX, para uso do PPS. A primeira premissa é considerar o problema da esquerda moderna a maximização simultânea de equidade e democracia por meio da política. A segunda premissa é a centralidade do Estado nesse processo. Com esses pressupostos, a fórmula passa a ser: socialismo é (ação do Estado no sentido de produzir) democracia, cidadania, sustentabilidade e inovação.

O Estado é central nesse processo, mas não o Estado atual, construído para benefício de grupos minoritários e privilegiados. A questão central é transformar esse Estado, a partir da pressão dos cidadãos, do seu voto, e do trabalho dos agentes públicos eleitos. Por isso a estratégia por excelência da esquerda de novo tipo é o processo de reforma democrática do Estado.

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